Aproveitando mais um passeio cultural na companhia do pessoal do Col. Est. Maria Zulmira Tôrres.
A exposição apresenta mais de cem obras-primas de grandes mestres de tradição pictórica italiana como Michelangelo, Leonardo da Vinci, Caravaggio, Bernini, Guido Reni, Melozzo da Forli, Beato Angelico, Correggio, Guercino, Lorenzo Lotto, Ticiano, Andrea Mantegna, entre outros. A exposição está dividida em quatro módulos: Jesus Cristo, Os Apóstolos, Virgem Maria e Os Santos.
No percurso da exposição e de seus múltiplos elementos expositivos, é possível descobrir que os primórdios da representação do sagrado no cristianismo apontam que, após a morte de Jesus, a divulgação dos valores cristãos foi se ampliando até atingir várias regiões do mundo antigo. E, por seus ideais e por sua fé, os seguidores do cristianismo primitivo foram perseguidos, torturados e mortos.
Os cristãos, temendo tal perseguição, sepultavam seus mortos nas catacumbas (cemitérios subterrâneos), onde podiam orar, entoar cânticos e pintar imagens religiosas ou cenas bíblicas que, em sua quase totalidade, eram realizadas por artistas anônimos.
Com a liberdade de culto aos cristãos concedida pelo Imperador Constantino, o cristianismo se expandiu e se tornou a religião oficial do Império Romano. Entretanto, a decoração interior das igrejas cristãs primitivas causaram discussões intensas, pois a Bíblia condenava o culto à imagem.
O Papa Gregório I defendeu, posteriormente, a utilização de imagens nas passagens bíblicas, enfatizando seu uso didático. Como muitos fiéis eram analfabetos, com essas pinturas muitos poderiam conhecer os episódios das narrativas sagradas. Assim, essa proposição foi seguida, na história da imagética cristã, com a função de propagar os valores religiosos.
A exposição A Herança do Sagrado é um percurso nesse universo simbólico-religioso e na história das imagens cristãs que, a cada época, (re)contam seu ideário imagético, revelando-nos a força poética do pensamento artístico e da religiosidade humana. Todas as imagens expostas nasceram da necessidade de interpretar o sagrado e são expressões evidentes dos desejos, das aspirações e dos anseios daqueles que buscavam o transcendente. A exposição apresenta uma concepção da espiritualidade humana como elemento que está na origem da própria devoção.
Primeiro módulo: JESUS CRISTO
O primeiro módulo da exposição apresenta uma série de representações de Jesus Cristo, Paixão e Ressurreição, a incredulidade de São Tomé, além de obras sobre parábolas como a do Bom Samaritano, a do Filho Pródigo, a de Cristo e a Adúltera, entre outros temas bíblicos.
MANDYLION DE EDESSA, séculos III-IV |
Do Manylion restam duas cópias antigas. A primeira, aqui exposta, é conservada no Vaticano; a outra, de época posterior, encontra-se em Gênova, na igreja de San Bartolomeo degli Armeni.
O Mandylion representa a imagem frontal de um homem de tez escura, com olhos abertos, fixos no espectador, e com o nariz comprido. Entre o nariz e a boca de lábios finos, destacam-se bigodes caídos. Os cabelos pretos descem sobre as têmporas e se misturam com a barba, que cobre parte da face e o queixo. Portanto, toda a atenção fica concentrada nos elementos mais espirituais do rosto: os olhos e a boca.
Sabe-se que em Roma era objeto de veneração, pelo menos desde o século VIII, a famosa Verônica, o Sudário do Santo Rosto. Também essa relíquia preciosa era um fino retÂngulo de tecido que, segundo a tradição, Jesus teria usado durante a subida ao Calvário para enxugar o suor, e no qual seu rosto ficara milagrosamente impresso. Ao chegar a Jerusalém, Volusiano descobre que Jesus havia sido crucificado. No entanto, ele consegue encontrar uma mulher, Berenice (depois traduzida como Berônica ou Verônica), que afirmava possuir um pano com a imagem de Cristo, e que o mensageiro acabou levando para Roma.
As cópias mais antigas da Verônica que chegaram até nós datam do século XIV. Conservadas no Tesouro de São Vito, em Praga, e na catedral de Jaén, na Espanha, elas remetem diretamente à imagem do Rosto Santo de Edessa, devido a algumas características idênticas às do Mandylion.
Ressurreição, 1542-Ticiano Vecellio |
O módulo é rico em obras da tradição antiga e inicia-se
com um achado arqueológico vindo dos Museus Vaticanos: as imagens dos apóstolos
Pedro e Paulo, representados com vestes romanas. Elas são umas das mais antigas
representações dos apóstolos e provavelmente remontam de uma época anterior à
oficialização do Cristianismo pelo Imperador Constantino 1700 anos atrás.
Esta pequena pintura que usa a técnica da encáustica traz
o busto do príncipe dos apóstolos, Pedro, e forma um conjunto com outra madeira
pintada com a mesma técnica e que apresenta o busto do apóstolo Paulo.
Originalmente, as duas peças constituíam um único artefato, considerado o mais
antigo testemunho das feições dos apóstolos Pedro e Paulo que chegou até nossos
dias. O conjunto foi guardado por muito tempo no Patriachio Lateranense (a residência
romana dos papas até 1309), como parte do Tesouro depositado por Leão III
(795-816) no oratório de San Lorenzo, por vez conhecido pela sua importância
como Tesouro do Sancta Sanctorum.
O díptico original era guardado numa pequena caixa e era
formado pela junção das duas madeiras sobrepostas. A tampa da caixa, decorada
internamente com a imagem de São Paulo, deslizava por meio de uma ranhura sobre
a outra parte da caixa, cujo interior conservava a imagem de São Pedro.
A forma peculiar do relicário – com as faces pintadas
voltadas para dentro e espaço interno limitado – demonstra que o objeto de
devoção era justamente as duas imagens sacras. Provavelmente, foram até os
excessos dessa devoção que danificaram involuntariamente a obra. A presença, no
lado externo dos painéis de resíduos de um composto resinoso (um empaste de
bálsamo e cera para unção ritual das imagens) sugere que o endurecimento desse
composto determinou, por ocasião de um dos exames periódicos do relicário, sua
abertura forçada e a quebra acidental das partes que uniam as tábuas.
Ao lado dessas imagens, que formam um díptico, estão
expostos achados provenientes da antiga basílica de São Pedro.
Relicário dos Apóstolos (Limoges), primeira metade do século XIII. Artista anônimo.
Quarto módulo: OS SANTOS
Relicário dos Apóstolos (Limoges), primeira metade do século XIII. Artista anônimo.
Terceiro módulo: VIRGEM MARIA
O módulo inicia-se com um livro de horas, manuscrito da
Biblioteca Apostólica Vaticana, aberto na página que contém uma iluminura de
Francesco Rosselli – um dos maiores miniaturistas da Renascença florentina –
representando a cena da Anunciação.
Também são apresentadas neste módulo obras de arte do
Oriente e do Ocidente com tema mariano.
ÍCONE DA NOSSA SENHORA DE VLADIMIR, primeira metade do
século XVII. Arte bizantina ou Greco-romana.
MOLDURA DE PRATA DO ÍCONE DA NOSSA SENHORA DE VLADIMIR,
1744-1746. Francesco Giardoni (1692-1757)
O ícone, que teria pertencido ao Papa Alexandre VII, foi
adquirido na segunda metade do século XVIII. A tábua é recoberta por riza de
lápis-lazúli, pérolas, granadas, ametistas, esmeraldas e topázios. O
revestimento de prata é obra de um ourives romano, como testemunham as marcas
de contraste na parte inferior da moldura, com as armas pontifícias e a abelha da
família Barberini. Tal revestimento anteciparia a datação da obra ao
pontificado de Urbano VIII.
As auréolas e a coroa são do mesmo autor da moldura e
foram copiosamente decoradas com dezoito pérolas, três granadas, duas
esmeraldas, um topázio doré, três berilos e duas safiras.
No entanto, é necessário estabelecer uma clara distinção
entre o ícone, sua armação e a moldura. A datação da pintura pode ser indicada
com segurança: primeira metade do século XVII. A imagem apresenta o tipo de
Madona com Menino conhecido no Ocidente como Virgem da Ternura de Vladimir e é
revestida de maneira preciosa, destituída de marcas de garantia.
A decoração da moldura do ícone apresenta um contraste de
cores e de matérias entre o azul-marinho das pedras, a prata e a prata dourada,
e se concentra em um único motivo: oito ornamentos formados por duplas de
espirais fitomórficas entrelaçadas e emolduradas, com enfeite de lápis-lazúli dispostos
simetricamente ao longo da superfície, criando efeitos de grande harmonia e
requintada elegância formal.
NOSSA SENHORA DO PARAPEITO, c. 1490
Bernardino di Betto, conhecido como Pinturicchio (atribuido)
Perugia, 1454 - Siena, 1513
Perugia, 1454 - Siena, 1513
MADONA COM O MENINO JESUS, 1425-1430
Lorenzo Ghiberti (Florença, 1378-1455) e ateliê
Lorenzo Ghiberti (Florença, 1378-1455) e ateliê
Quarto módulo: OS SANTOS
O último módulo
constitui uma grande galeria de pinturas com imagens de muitos santos, como São
Sebastião, padroeiro do Rio de Janeiro.
A obra de Guido Reni, proveniente da Pinacoteca
Capitolina de Roma, está acompanhada por um antigo relicário do século IX, que
conservava a cabeça de São Sebastião, vindo dos Museus Vaticanos. Junto a esse
relicário estão expostos outros objetos preciosos, obras de artistas renomados
ou de artesãos desconhecidos.
Ícone do classicismo pictórico italiano, modelo
heterogêneo de devoção e sensualidade, de beleza masculina e de ascese, o São
Sebastião de Guido Reni figura como uma síntese do estilo do artista e de sua
capacidade de elaborar imagens sacras ricas de significado.
O corpo de São Sebastião é o indiscutível protagonista da
pintura, um corpo viril e tranquilo, um corpo que sangra e que se oferece a
Deus.
O santo – objeto de culto por causa de seu papel “milagreiro”,
sobretudo mas epidemias da peste – é uma presença tradicional na arte religiosa
italiana e europeia, desde a Idade Média. Guido Reni, coerente com o próprio
percurso, oferece nesse caso uma versão
idealizada, na qual o sofrimento humano do martírio é sublimado pelo fervor
extático. Destinada à devoção privada, e não ao culto público, essa pintura
parece resumir o debate acirrado sobre o valor das imagens sacras,
particularmente em alguns círculos teológicos da primeira metade do século
XVII.
SÃO TIAGO PEREGRINO, 1558
Ticiano Vecellio (Pieve de Cadore, Belluno, c. 1480 - Veneza, 1576
Exposição: A HERANÇA DO SAGRADO - OBRAS-PRIMAS DO VATICANO E MUSEUS ITALIANOS
De 10 de julho a 13 de outubro de 2013.
Museu Nacional de Belas Artes. Rio de Janeiro.
(Publicação baseada nos folhetos de divulgação e explicativos da exposição)
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